A morte materna é qualquer morte que acontece
durante a gestação, parto ou até 42 dias após o parto, desde que decorrente de
causa relacionada ou agravada pela gravidez. Cerca de 92% são evitáveis e
ocorrem principalmente por hipertensão, hemorragia, infecções e abortos provocados. Após não ter cumprido
compromisso internacional para a redução de 75% das mortes maternas até 2015, o
Brasil registrou aumento dessa ocorrência em 2016.
Segundo dados do Ministério da
Saúde, a taxa de mortalidade materna já vinha mal nos últimos anos: depois de
cair 56% desde 1990, teve leve alta em 2013. Voltou a cair em 2015, num sinal
de estabilização, e teve um repique em 2016 —último ano com dados oficiais
consolidados.
Em 2000, o país fez pacto para
baixar em 75% as mortes maternas até 2015 dentro dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio, fixados pela ONU com apoio de 191 países.
A meta era se limitar a 35
óbitos por 100 mil nascidos vivos. Mas em 2015 a taxa ficou em 62 por 100 mil
nascidos vivos (redução de 57%) e, no seguinte, subiu para 64,4.
As regiões Norte e Nordeste
concentram as taxas mais altas (84,5 e 78). No Amapá, chega a 141,7, índice
comparável a países como Butão e Argélia.
O Sul e o Sudeste brasileiros
têm os menores índices: 44,2 e 55,8, respectivamente. Ainda assim, estão
distantes de países como Polônia, Finlândia, Suécia, Áustria e Itália, que
registram entre 3 e 4 mortes maternas por 100 mil nascidos vivos, segundo dados
de 2015.
Em maio deste ano, o Brasil
reiterou a meta de redução da mortalidade materna em 50% nos próximos 12 anos,
chegando a 30 mortes por 100 mil nascidos vivos em 2030 —o plano original era
chegar a 2030 com 20 mortes por 100 mil.
“O alcance dessa meta
demandará ações eficientes e eficazes, baseadas em evidências científicas e
compromisso dos gestores com políticas públicas que promovam justiça, reduzam
as iniquidades em saúde e as desigualdades sociais, incluindo a redução das
mortes por abortamento inseguro”, diz nota técnica do Ministério da Saúde.
Segundo o ginecologista
Rodolfo Pacagnella, presidente da Comissão de Mortalidade Materna da Febrasgo
(federação das sociedades de ginecologia e obstetrícia), a morte materna é
causada por uma somatória de erros e demora na assistência à mulher.
“Só o pré-natal não reduz
mortes maternas. A mulher pode ter um pré-natal normal, mas apresentar uma
complicação no final da gestação e morrer pela demora em receber assistência
adequada.”
Ele afirma que há três
situações em que o tempo perdido pode ser crucial: 1) quando há demora para a
mulher reconhecer os sinais de gravidade e procurar ajuda; 2) quando se perde
muito tempo para chegar à unidade qualificada para atendê-la; 3) e quando
existe demora para receber assistência, mesmo em um local preparado para isso.
A Febrasgo preparou uma série
de recomendações que deveriam ser adotadas nos serviços de saúde para a redução
das mortes maternas, desde o planejamento reprodutivo até a melhoria da rede de
assistência em todas fases da gestação e puerpério.
“A gente sabe que em
maternidades muito pequenas há um número maior de cesáreas, equipes menos
qualificadas e problemas estruturais graves”, relata. O ideal, segundo ele, é ter
uma rede de assistência que envolva maternidades de médio e grande porte,
qualificação das equipes, suprimentos de forma adequada.
A entidade também defende a
descriminalização do aborto como forma de enfrentamento das mortes maternas, o
que está sob análise do STF (Supremo Tribunal Federal).
Hoje a interrupção voluntária
da gravidez é a quarta causa de morte materna. Para Greice Menezes, médica
epidemiologista e professora da Ufba (Universidade Federal da Bahia), é
possível que a mortalidade materna esteja sofrendo os mesmos efeitos dos
fatores associados ao aumento da mortalidade infantil, como a crise econômica,
o ajuste fiscal e os cortes de investimentos em saúde.
Em 2016, foi aprovada emenda
constitucional que congela gastos públicos por até 20 anos. “A literatura
internacional mostra que a mortalidade materna e a infantil são sempre os
indicadores primeiramente acionados nesses momentos de crise”, diz ela.
Reportagem da Folha publicada em julho mostrou
que, pela primeira vez desde 1990, houve aumento na taxa de mortalidade infantil do Brasil em 2016, e a
tendência é que o índice de 2017 se mantenha acima do registrado em 2015.
A epidemia do vírus da zika e a crise econômica são apontadas
pelo Ministério da Saúde como causas do crescimento. A primeira, pela queda de
nascimentos (o que traz impacto no cálculo da taxa de mortalidade) e pelas
mortes de bebês por malformações graves.
Já a crise estaria associada
às mortes infantis evitáveis, causadas por diarreias e pneumonias, que são
influenciadas pela perda de renda das famílias, estagnação de programas sociais
e cortes na saúde pública.
Para a pesquisadora da Ufba,
as restrições na atenção primária e ao funcionamento das equipes de saúde da
família trazem impactos negativos. “O agente de saúde da família conhece a
área, identifica as gestantes, faz busca ativa da gestante no pré-natal. A
limitação desse tipo de trabalho certamente vai refletir nas taxas”, afirma
Greice.
Em nota, o Ministério da Saúde
diz que vem ampliando a qualificação da atenção à saúde das mulheres por meio
do planejamento familiar, da capacitação de profissionais de saúde,
fortalecimento da atenção obstétrica por meio de ações estratégicas como a Rede
Cegonha e redução de complicações obstétricas.
Entre as ações estão os projetos Parto Cuidadoso, para reduzir taxas de cesáreas, e o Zero Morte Materna por Hemorragia, desenvolvido em parceria com a Opas (Organização Pan-Americana da Saúde).
Por:
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/08/mortalidade-materna-sobe-e-brasil-ja-reve-meta-de-reducao-para-2030.shtml
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