Parcela do eleitorado
– indignada com a situação do País, enfurecida com a corrupção e com a
violência – tem sede de vingança. E esse sentimento aproxima essas pessoas do
candidato Jair Messias Bolsonaro, que não faz outra coisa na vida a não ser
reforçar a revolta nas pessoas.
Quando um agente
político identifica uma situação de desconforto e recomenda uma punição para os
seus supostos responsáveis, esse gesto o aproxima das pessoas que estão
incomodadas com a situação, fazendo-as imaginar que esse diagnóstico comum é
suficiente para fazer dele (agente político) seu representante no Congresso ou
no Poder Legislativo. O “messianismo” ou a crença na vinda de um salvador ou
redentor, caído do céu, imaculado e justiceiro, para libertar o povo de seus
males, é um fato na cultura da Humanidade, mas, ao mesmo tempo, pode gerar a
alienação dos indivíduos quanto a serem, eles mesmos, os agentes para a solução
dos problemas identificados.
O método adotado por
Bolsonaro para sensibilizar seus apoiadores consiste em apontar problemas
(criminalidade, corrupção, desemprego), indicar os supostos culpados (a
esquerda, os comunistas, os malandros e corruptos), além de sugerir uma suposta
solução (a punição, no caso a repressão, o encarceramento, o corte de direitos
e serviços públicos etc), numa construção que denota causa e efeito.
Para potencializar e
manter as pessoas presas a essa fórmula, seus apoiadores utilizam as redes
sociais para espalhar discórdia, mentiras e apontar fatos da realidade que
chocam a sociedade. Existe um exército de mercenários, a serviço dos
bolsonaristas, que alimenta, estimula e sustenta esse tipo de campanha
permanente.
É o modo de
comunicação troll, que provoca reações enfurecidas, estimula um comportamento
de massas, manipula, maneja e molda as crenças e sentimentos das pessoas sem
contar com o consentimento ou vontade consciente delas. Provoca os instintos
mais primitivos do ser humano.
Essa é uma fórmula –
empregada em larga escala pelos fascistas e nazistas – que conduz as pessoas,
sem que elas tenham o trabalho de raciocinar, disparando o gatilho mental da
raiva ou do ódio sempre que se depara com uma situação ou notícia ruim.
O exemplo mais
acabado disso foi o nazismo, uma doutrina ideológica de direita, que Adolf
Hitler liderou na Alemanha no século passado. As táticas adotadas pelo Partido
Nazista começaram por apontar os judeus como os culpados por todos os males da
Alemanha. A partir daí, promoveram o seu expurgo da vida política e econômica e
acabaram por praticar o seu extermínio como “solução final”.
O nazismo tinha como
elemento mobilizador exatamente essa fórmula empregada por Jair Bolsonaro e sua
turma, que consiste em culpar a esquerda, os comunistas e os pobres,
especialmente os negros e as pessoas que dependem de políticas de transferência
de renda, pelos males do País.
Com esse método, as
pessoas são induzidas a achar que a punição, a repressão, o encarceramento –
combinados com a supressão de direitos e de liberdades de determinados
segmentos – vão resolver todos os problemas do País.
O assustador nisso é
que os bolsonaristas, sem o menor pudor, exploram a fé e a ignorância
(desinformação) de muita gente, de um lado, invocando a religião e a defesa da
família, e, de outro, a necessidade de emprego da força para punir os culpados
pelos problemas do País.
Em nome da defesa da
família, toda hora invocando o nome de Deus, atribuem a piora da situação à corrupção,
às políticas de transferência de renda para presidiário, às quotas aos
vulneráveis, à ausência de porte de armas, ao Estatuto da Infância e do
Adolescente, que não pune o menor infrator com o mesmo rigor dos adultos.
As pessoas,
envenenadas contra os “inimigos”, se enchem de ressentimento e até de ódio e
viram militantes ou ativistas de teclados, repassando pelas redes sociais toda
e qualquer “informação” contra esse suposto inimigo. Nessa hora, até o nome do
candidato (que tem por segundo nome “Messias”) fortalece a ideia de que essa
“ira santa” é legítima.
Para sair dessa
armadilha, as pessoas precisam raciocinar, pensar, agir racionalmente. Por
exemplo. Precisam indagar se o candidato e sua equipe são capazes, têm
propostas viáveis ou reúnem condições para solucionar os graves problemas do
País. Sobretudo, devem procurar saber se o candidato tem, ele mesmo, capacidade
de pensar o País, de analisar a realidade e a conjuntura por seus próprios
méritos e identificar as soluções sem abrir mão de suas responsabilidades, pois
é ele, em última análise, que irá responder pelo Governo. A punição apenas
castiga os erros do passado, mas não resolve os problemas que deram causa à
punição nem os outros problemas que exigem decisão política, capacidade intelectual,
idoneidade moral, recursos e capacidade de gestão.
Ninguém deve pautar
seu voto apenas pelo diagnóstico. Se alguém constata que uma situação está ruim
não significa que ela (essa pessoa) estará habilitada ou reúne condições para
melhorar a situação. Votar por coincidência de diagnóstico não apenas não é
recomendável, como é temerário.
Esse tipo de eleitor,
que age de modo irrefletido ou por impulso, confiando cegamente no messianismo
do candidato, sem verificar se ele e sua equipe têm condições de resolver os
problemas que afligem a população, é o mais vulnerável. Ele será a potencial
vítima de sua escolha, caso seu candidato seja eleito. Além do risco de estar
elegendo seu próprio algoz, tende a perder em qualquer hipótese: na vitória e
na derrota de seu candidato.
Na hipótese de
vitória, a frustração será inevitável, tanto pela falta de governabilidade
(incapacidade de aprovar e implementar o que prometeu) do futuro governante,
quanto pelo conteúdo das propostas, que, no caso de Bolsonaro, sinalizam para
um brutal corte de serviços públicos e de direitos e programas sociais.
Para assegurar a
governabilidade e evitar a paralisia ou o colapso das instituições e dos
serviços públicos, é indispensável que o governo reúna quatro tipos de
estabilidade: política, social, financeira e de gestão.
E Bolsonaro não reúne
nenhuma delas, a começar pela base parlamentar. Seu partido não elegerá nem 20
deputados nem três senadores e irá precisar, para aprovar suas propostas de
alteração na Constituição, de pelo menos 308 votos na Câmara e 49 no Senado.
Quanto ao conteúdo,
as propostas não se destinam a proteger os assalariados (trabalhadores,
servidores e aposentados) nem atender às demandas da população por serviços
públicos de qualidade, saúde, educação, transporte e emprego, mas ao desmonte
do Estado, com a venda de estatais e o corte de direitos trabalhistas,
previdenciários e a redução dos programas sociais e dos serviços públicos.
A prioridade máxima
será a repressão em substituição à prevenção, o que irá ampliar a violência,
tanto de parte dos policiais, como dos próprios bandidos e infratores, que
passarão a ser mais violentos com suas vítimas. O argumento de que o País já
está em “guerra civil” só levará, nessa perspectiva, a uma escalada nessa
guerra, onde os mais fracos (os cidadãos) serão os mais prejudicados.
Num cenário desses,
os eleitores muito engajados na defesa das ações de repressão estarão muito
mais expostos à violência policial do que os demais, já que a polícia em ação
não identifica quem é aliado ou adversário do governo.
No caso de derrota,
esse eleitor se transformará (se já não for) numa espécie de talibã – com seu
fundamentalismo persecutório, moralista e justiceiro – e irá questionar o
resultado eleitoral e defender as “ideias” do candidato derrotado, comprando
briga com familiares, amigos e vizinhos, deixando em segundo plano sua vida
profissional.
Se o eleitor tiver
consciência desses riscos e quiser botar fogo no País, pode continuar apoiando
candidatos com essas características. Entretanto, se quiser resolver os
problemas, deve refletir melhor sobre seu voto. Estará entre duas opções:
condenar o País à escuridão ou acender uma vela.
Por: Antônio Augusto de Queiroz é
jornalista, consultor, analista político e diretor de Documentação do Diap e Luiz
Alberto dos Santos é advogado, Mestre em Administração e Doutor em Ciências
Sociais e professor colaborador da EBAPE/FGV e ENAP.
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