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Ontem, o presidente da
Câmara se mostrou insatisfeito com o comportamento do governo na casa e com as
críticas de Carlos Bolsonaro, filho do presidente e vereador no Rio de Janeiro,
e chegou a ameaçar abandonar a articulação da reforma da Previdência. O
movimento trouxe impactos ao mercado e contribuiu para uma queda de 3% na bolsa
brasileira. Ao jornal, contudo, Maia amenizou o tom e disse que seguirá nessa
articulação.
“Quanto mais eles (governo
Bolsonaro) tentam trazer pra mim a responsabilidade do governo, mais está
piorando a relação com o Parlamento”, disse Maia, “o governo precisa vir à
público de forma mais objetiva, com mais clareza, com mais energia na votação
da reforma”. Para o presidente da Câmara, Bolsonaro está dando sinais de
insegurança sobre as mudanças na Previdência e precisa “assumir o discurso do
ministro Paulo Guedes”.
Embora Maia tenha baixado a
guarda a respeito das suas declarações sobre a reforma da Previdência, não
poupou o governo de Jair Bolsonaro de críticas mais gerais, sobretudo ao
“projeto de governo” dessa gestão e a presença marcante do presidente e seus
aliados nas redes sociais. “O Brasil precisa sair do Twitter e ir pra vida
real”
“Qual é o projeto do governo
Bolsonaro fora a reforma da Previdência? Fora o projeto do ministro Moro? Não
se sabe. Qual o projeto de um partido de extrema-direita para acabar com a
pobreza? Criticaram o Bolsa Família e não propuseram nada até agora”, disparou
o deputado que finalizou dizendo que “o governo é um deserto de ideias”.
Maia se mostrou, ainda,
desfavorável a uma possível intervenção militar na Venezuela, ventilada por
outro filho de Bolsonaro, o deputado Eduardo, em entrevista concedida a um
jornal chileno na última sexta-feira, 22. “Estamos com a estrutura das Forças
Armadas desabastecida”, explicou, “não temos condições de segurar 24 horas de
confronto com a Venezuela”.
Veja
a entrevista completa:
Por
que o sr. decidiu abandonar a articulação da reforma da Previdência?
Apenas entendo que o governo
eleito não pode terceirizar sua responsabilidade. O presidente precisa assumir
a liderança, ser mais proativo. O discurso dele é: sou contra a reforma, mas
fui obrigado a mandá-la ou o Brasil quebra. Ele dá sinalização de insegurança
ao Parlamento. Ele tem que assumir o discurso que faz o ministro Paulo Guedes.
Hoje, o governo não tem base. Não sou eu que vou organizar a base. O presidente
da Câmara sozinho, em uma matéria como a reforma da Previdência, não tem
capacidade de conseguir 308 votos.
Mas
o sr. continua à frente da articulação?
Dentro do meu quadrado, sim.
Agora, acho que quanto mais eles tentam trazer para mim a responsabilidade do
governo, mais está piorando a relação do governo com o Parlamento. O governo
precisa vir a público de forma mais objetiva, com mais clareza, com mais
energia na votação da reforma.
O
que o presidente Bolsonaro precisa fazer?
Ele precisa construir um
diálogo com o Parlamento, com os líderes, com os partidos. Não pode ficar a
informação de que o meu diálogo é pelo toma lá, dá cá. A gente tem que parar
com essa conversa. Como o presidente vê a política? O que é a nova política
para ele? Ele precisa colocar em prática a nova política. Tanto é verdade que
ele não colocou que tem (apenas) 50 deputados na base. Faço o alerta: se o
governo não organizar sua base, se não construir o diálogo com os deputados,
vai ser muito difícil aprovar a reforma da Previdência. O ciclo dos últimos 30
anos acabou e agora se abre um novo ciclo. Ele precisa saber o que colocar no
lugar. O Executivo precisa ser um ator ativo nesse processo político.
E
não está sendo?
De forma nenhuma. Ele está
transferindo para a presidência da Câmara e do Senado uma responsabilidade que
é dele. Então, ele fica só com o bônus e eu fico com o ônus de ganhar ou
perder. Se ganhar, ganhei com eles. Se perder, perdi sozinho. Isso, para a
reforma da Previdência, é muito grave. Não é uma votação qualquer, para você
falar “leva que o filho é teu”. Não é assim. É uma matéria será um divisor de
águas inclusive para o governo Bolsonaro. Então, ele precisa assumir
protagonismo. Foi isso o que eu falei. Não vou deixar de defender as coisas
sobre as quais tenho convicção porque brigo com A, B ou C. Meu papel
institucional não é usar a presidência da Câmara para ameaçar o governo.
Mas
o sr. ficou bastante contrariado com os ataques da rede bolsonarista na
internet…
Não é que eu fiquei
incomodado. O que acontece é que o Brasil viveu sua maior recessão no governo
Dilma, melhorou um pouco no último governo, só que a vida das pessoas continua
indo muito mal. Então, na hora em que a gente está trabalhando uma matéria tão
importante como a Previdência, e a rede próxima ao presidente é instrumento de
ataque a pessoas que estão ajudando nessa reforma, eu posso chegar à conclusão
de que, por trás disso, está a vontade do governo de não votar a Previdência.
Não fui só eu que fui criticado. Todo mundo que de alguma forma fez alguma
crítica ao governo recebe os maiores “elogios” da rede dos Bolsonaro. Isso é ruim
porque você não respeitar e não receber com reflexão uma crítica não é um sinal
de espírito democrático correto.
O
posicionamento do vereador Carlos Bolsonaro nas redes sociais atrapalha o
governo?
O Brasil precisa sair do
Twitter e ir para a vida real. Ninguém consegue emprego, vaga na escola,
creche, hospital por causa do Twitter. Precisamos que o País volte a ter
projeto. Qual é o projeto do governo Bolsonaro, fora a Previdência? Fora o
projeto do ministro (Sérgio) Moro? Não se sabe. Qual é o projeto de um partido
de direita para acabar com a extrema pobreza? Criticaram tanto o Bolsa Família
e não propuseram nada até agora no lugar. Criticaram tanto a evasão escolar de
jovens e agora a gente não sabe o que o governo pensa para os jovens e para as
crianças de zero a três anos. O governo é um deserto de ideias.
O
sr. está dizendo que o governo não tem proposta?
Se tem propostas, eu não as
conheço.
Há
uma nova versão do ‘nós contra eles’?
Eles construíram nos últimos
anos o ‘nós contra eles’. Nós, liberais, contra os comunistas. O discurso de
Bolsonaro foi esse. Para eles, essa disputa do mal contra o bem, do sim contra
o não, do quente contra o frio é o que alimenta a relação com parte da sociedade.
Só que agora eles venceram as eleições. E, em um país democrático, não é essa
ruptura proposta que vai resolver o problema. O Brasil não ganha nada
trabalhando nos extremos.
Temos
um desgoverno?
As pessoas precisam da
reforma da Previdência e, também, que o governo volte a funcionar. Nós temos
uma ilha de governo com o Paulo Guedes. Tirando ali, você tem pouca coisa. Ou
pouca coisa pública. Nós sabemos onde estão os problemas. Um governo de direita
deveria estar fazendo não apenas o enfrentamento nas redes sociais sobre se o
comunismo acabou ou não, mas deveria dizer: “No lugar do Minha Casa, Minha
Vida, para habitação popular nós estamos pensando isso; para saneamento, nós
estamos pensando aquilo”.
O
presidente minimizou a crise dizendo que vai conversar com o sr e que tudo é
como uma briga no namoro. O que achou?
Se o presidente não falar
comigo até o fim do mandato, não tem problema. Sou a favor da reforma da
Previdência. O problema é que ele precisa conseguir várias namoradas no
Congresso, são os outros 307 votos que ele precisa conseguir. Ele pode me
deixar para o fim da fila.
E
por que o sr. entrou em um embate com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, por
causa do pacote anticrime?
Certamente, conheço a Câmara
muito melhor do que o ministro Moro. E sei como eu posso ajudar o projeto sem
atrapalhar a Previdência. O que me incomodou? O ministro passou da fronteira.
Até acho que em uma palavra ou outra me excedi, mas, na média, coloquei a
posição da Câmara. O governo quer fazer a nova política. Nós queremos
participar da nova política.
A
prisão do ex-presidente Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco serviu
para tumultuar esse ambiente político?
Eu não acho. As instituições
precisam funcionar. Uns gostam da decisão, outros não. Mas ela precisa ser
respeitada e aquele que se sentir prejudicado por uma decisão da Justiça tem o
poder de recorrer.
Fonte: https://exame.abril.com.br/brasil
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