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Para
além das já noticiadas relações do Ministro Gilmar Mendes com os sócios da JBS,
a reportagem chama a atenção por outro aspecto: o financiamento, com dinheiro
da JBS, do grupo de estudos em Direito do Trabalho.
Na
página do IDP na Internet, obtêm-se as informações de que o Grupo de Pesquisa
de Direito do Trabalho foi lançado em 30 de junho de 2016, sob a coordenação do
Presidente do TST, Ministro Ives Gandra Filho, para, segundo a apresentação ali
feita, a produção de estudos e artigos temáticos, realização de seminários,
“buscando encontrar soluções para os problemas que ora são mais cruciais na
seara laboral, passíveis de embasar projetos de lei ou ser supedâneo para
decisões judiciais”.
Além
dos Ministros Gilmar e Ives, figuram como coordenador do Grupo e como
professores orientadores três Juízes do Trabalho que, coincidentemente, são
juízes auxiliares da presidência do TST, afastados da jurisdição. Outra
coincidência: a Secretaria-Executiva do Grupo de Pesquisa coube à mesma senhora
que é Secretária-Geral do CSJT - Conselho Superior da Justiça do Trabalho,
também presidido pelo Ministro Ives.
É
muito importante examinar as linhas de pesquisa do Grupo, no campo do Direito
Material do Trabalho, retiradas da página do IDP:
“A) Direito do Trabalho:
- A
extração de novos direitos trabalhistas a partir da exegese do ordenamento
jurídico vigente à luz dos princípios constitucionais e laborais – baseado em
levantamento de que direitos trabalhistas têm sido criados ou ampliados pela
jurisprudência do TST invocando princípios constitucionais ou legais próprios
do Direito do Trabalho e seu impacto na empregabilidade.
- Um
marco regulatório seguro para o fenômeno da terceirização – perquirindo-se
sobre quais seriam os parâmetros justos para se disciplinar o fenômeno da
terceirização, inclusive no setor público.
- As
micro e pequenas empresas e o Direito do Trabalho – perquirindo sobre que
reformas trabalhistas seriam necessárias para não comprometer a existência e
funcionamento das micro e pequenas empresas, especialmente em contexto de crise
econômica.
- O
tempo à disposição do empregador e sua remuneração – estudo para aperfeiçoar o
conceito, hipóteses, efeitos e remuneração do período não laborado do
trabalhador.
- O
Direito e a Justiça do Trabalho e a empregabilidade – partindo do levantamento
de que encargos sociais as empresas mais reclamam como entraves à
competitividade e empregabilidade, para subsidiar eventuais reformas
trabalhistas.
B) Direito Sindical:
- Os
meios alternativos de composição de litígios na seara trabalhista – analisando
a jurisprudência e a realidade fática atual, para verificar como inserir
adequadamente na seara laboral os meios alternativos de composição de litígios,
constituídos pela arbitragem, mediação, conciliação prévia e negociação coletiva,
de forma a desafogar a demanda judicial não assimilada pela Justiça do
Trabalho.
- O
conceito de Indisponibilidade de direitos – partindo da conjugação dos
princípios da proteção e da subsidiariedade, propostos pela Doutrina Social
Cristã, verificar quais seriam os parâmetros adequados para fixar um conceito
de indisponibilidade de direitos em matéria de negociação coletiva.
- Os
limites da autonomia negocial coletiva – baseado em levantamento de quais
cláusulas de acordos e convenções coletivas de trabalho têm sido anuladas pela
Justiça do Trabalho e por que razão.
A
reforma sindical possível – estudando que reformas sindicais seriam precisas
para tornar mais legítima a negociação coletiva.
As
fontes de financiamento do sistema sindical – estudo das fontes atuais de
custeio do sistema sindical e propostas de seu aperfeiçoamento.”
No
dia 30 de março de 2017, o Grupo de Pesquisa lançou o 1.º Caderno de Pesquisas
Trabalhistas do GPDT, com onze artigos. Foram premiados, com um total de R$
20.000,00, os autores dos três melhores trabalhos selecionados. Sobre o evento,
publicou o sítio do IDP na Internet: “De acordo com o Ministro Ives Gandra, o
principal propósito do GPDT, a partir da publicação do 1.º Caderno de Pesquisa
Trabalhista, é ‘que, da análise de nossa jurisprudência trabalhista, cotejada
com a legislação e a doutrina, verificando os impactos que provoca na realidade
econômica e social, possa-se chegar a soluções e propostas que contribuam para
o aperfeiçoamento e modernização de nossa legislação laboral”.
E
mais: “De acordo com o Ministro Gilmar Mendes, que coordenou junto ao Ministro
Ives Gandra a publicação do Caderno de Pesquisas Trabalhistas, o Brasil
vivencia um grande desafio acerca da legislação trabalhista nacional, que se
utiliza de modelos obsoletos que não correspondem à realidade globalizada:
‘Hoje, o nosso país tem uma massa de desempregados graças a essa brutal
recessão. Há famílias que são dilaceradas por esse fenômeno. Não queremos um
sistema engessado e precisamos ter uma visão diferente sobre a reforma
trabalhista’.
Em
26 de abril de 2017 foi aprovada, na Câmara dos Deputados, a denominada reforma
trabalhista, a partir de substitutivo apresentado pelo relator da matéria. A
coincidência entre os eixos centrais da reforma e as linhas de pesquisa do
Grupo de Pesquisa de Direito do Trabalho (IDP) é absoluta! Sem nenhuma dúvida,
o propósito de "subsidiar eventuais reformas trabalhistas" foi
plenamente alcançado. Por outro lado, a lógica que direcionou o trabalho do
relator é em tudo coincidente com a visão dos Ministros Gilmar e Ives sobre o
Direito do Trabalho.
No
dia 28 de abril de 2017, a ministra do TST Kátia Arruda encaminhou ofício ao
presidente da Corte questionando se propostas de emendas da reforma trabalhista
teriam saído da presidência do tribunal, conforme indicara reportagem publicada
pelo The Intercept Brasil.
Por
todo esse tempo, nos jornais e na TV, pôde-se ver outro juiz do trabalho,
também assessor da presidência do TST, a reproduzir as curiosas ideias do
Ministro Ives, em pronunciamentos e entrevistas, magistrado este que,
declaradamente, atuou em comissão na Presidência da República, criada para
redigir a proposta de "reforma" e, depois, no auxílio ao relator da
“reforma trabalhista”, na Câmara, devidamente liberado das funções jurisdicionais,
nas duas situações.
O
encadeamento dos fatos conduz, razoavelmente, à conclusão de que o Grupo de
Pesquisa de Direito do Trabalho do IDP, liderado pelo Presidente do TST,
coordenado por juízes auxiliares da presidência do TST, secretariado pela
Scretária-Geral do Conselho Superior da Justiça do Trabalho - também presidido
pelo Ministro Ives -, produziu subsídios para a reforma trabalhista, que foram
integralmente acolhidos pelo relator da matéria na Câmara dos Deputados,
havendo suspeita de que até as emendas apresentadas ao relator tenham saído do
gabinete da presidência do TST. O mais grave: tudo financiado pela JBS, que
repassou ao IDP mais de 2 milhões de reais, nos últimos dois anos.
Ninguém
ignora que os Ministros Gilmar e Ives, especialmente este, não têm nenhum
apreço pelo Direito do Trabalho e pela Justiça do Trabalho e que querem, a todo
custo, ver aprovada a brutal "reforma trabalhista", de interesse
exclusivo do grande capital.
Só
não se sabia, até ontem, que esses custos tinham sido suportados pela JBS,
empresa envolvida no mais escandaloso esquema de corrupção do país e, desde
sempre, impiedosa exploradora dos seus infelizes empregados, contumaz demandada
na Justiça do Trabalho e notória devedora da Previdência Social.
A
origem espúria dos recursos é indiscutível e reconhecida pelo próprio IDP: “Ao
ser questionado pela Folha sobre o assunto, o instituto disse que devolveu R$
650 mil deste total no dia 29 de maio, após revelação de acordo de delação
premiada de executivos da empresa. O IDP diz que, em razão de uma cláusula
contratual relacionada à conduta ética e moral do patrocinador, rescindiu um
contrato assinado em junho de 2015 com o grupo”. Restam R$ 1.450 mil.
E
o Ministro Ives, a título de, digamos, contribuição pessoal, escalou
mão-de-obra altamente qualificada para assegurar o resultado pretendido e abriu
mão da integral concorrência nos serviços do gabinete da presidência do TST de
quatro de seus juízes auxiliares e da Secretária-Geral do CSJT.
Parece
ter sido simples assim: a JBS financiou, o TST e o CSJT indicou quadros
qualificados, o GPDT/IDP orientou a produção de textos e os publicou, estes
subsídios foram apresentados ao relator da “reforma trabalhista” que os
acolheu, prontamente, para escravizar os trabalhadores brasileiros. Será que
isso se harmoniza com a Doutrina Social Cristã?
Por: Hugo Cavalcanti Melo Filho é juiz do trabalho e
presidente da Associação Latino-americana de Juízes do Trabalho.
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