"Ao sacrificar o essencial pelo
que é urgente, acaba-se por esquecer a urgência do que é essencial" - Edgar
Morin
É urgente saber distinguir o
que é essencial e, ao mesmo tempo, saber tratar adequadamente as urgências. A
abordagem que deve ser buscada, para quem hoje atua e quer ser protagonista do
futuro, é aquela em que o essencial orienta as estratégias do enfrentamento das
urgências.
É essencial inventar o
sindicato do futuro e é urgente resistir, hoje e agora, aos ataques que visam
destruir o movimento sindical e a capacidade coletiva de luta dos
trabalhadores. Inventar e resistir são movimentações complementares, se
estiverem conectados. A resistência deve incluir a destinação de tempo,
dinheiro e trabalho para o investimento na invenção do sindicato do futuro, a
ser feita de maneira que consiga animar a própria resistência. O trabalho de
invenção é, em certa medida, a construção de uma utopia – o sindicato que será
capaz de mobilizar as lutas futuras dos trabalhadores – que precisa ser bela e
forte, para ser capaz de encantar a militância sindical e colocá-la em
movimento de criação e construção do novo, enquanto se resiste, aqui e agora.
Inventar significa descobrir e
revelar aquilo que está encoberto: as mudanças radicais e disruptivas no
sistema produtivo; as múltiplas faces da inovação tecnológica, o impacto sobre
os empregos e as profissões; a transferência patrimonial do capital para
acionistas ávidos por lucros exorbitantes; as novas dimensões da globalização;
a flexibilização radical das relações de trabalho e da proteção laboral e
social; as diferentes formas de contratação, de jornada de trabalho, de
inserção no mundo do trabalho; as ocupações inseguras e flexíveis, que ganham
prevalência sobre o emprego; as transformações do Estado; a transição forçada
da proteção social para a assistência, da previdência para o seguro, da
solidariedade para a meritocracia; do coletivo e solidário para o
individualismo. Essas transformações, entre inúmeras outras, fazem emergir um
mundo do trabalho que o sindicato não conhece e um trabalhador distante do
sindicato. A invenção começa com a descoberta desse mundo.
Inventar significa também
imaginar, elaborar e arquitetar algo que ainda não existe e, portanto, é
inédito. O essencial é, descobrindo as questões acima, inventar o sindicato do
futuro como o sujeito coletivo e solidário, que conduzirá a organização, a
mobilização, a formação, a negociação e as lutas no contexto desse amanhã
incerto, mas que gradativamente vai se fazendo presente na vida dos
trabalhadores. O mundo do trabalho será muito diferente daquele que conhecemos
e que deu origem ao sindicato que hoje existe. Será preciso acreditar e
investir na possibilidade do insight, daquela iluminação mental que abre
caminhos e é capaz de ver novas possibilidades, que arquiteta estruturas e
desenha processos de criação e de produção.
Para a utopia, há antes o
desafio da criação, de produzir o inédito, de gestar e de parir. Criar, no
contexto social, é promover processos de transformação. O essencial é saber que
a mudança estrutural do mundo do trabalho coloca o desafio de inventar o
sindicato do futuro como resposta política e organizativa para gerar força,
unidade e inteligência para os trabalhadores escreverem a própria história,
cujo compromisso deve ser o de gerar o bem-estar e a qualidade de vida para
todos.
Amarrados no presente e presos
às urgências desconectadas do que é essencial, corremos o risco de sermos
coveiros do atual sindicato. Olhando de maneira exclusiva e saudosista para o
passado e tudo o que fizemos com sucesso, corremos o grave risco de não conseguirmos
descobrir e prospectar sobre o futuro. Presos à estrutura que construímos,
corremos o risco da cegueira situacional e de não vermos a transformação que
brota no solo do sistema produtivo.
É urgente promover as mudanças
na atual estrutura sindical e no sistema de negociação, com uma transição
estrategicamente planejada e organizada, para que os trabalhadores e a atual
organização e estrutura sindical sejam capazes de se inventar para esse amanhã
que já nos acompanha no presente. É fundamental promover mudanças que gerem
capacidade para enfrentar as adversidades presentes na negociação coletiva, na
organização e no financiamento sindical.
Por: Clemente Ganz Lúcio é
sociólogo e diretor técnico do DIEESE
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