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sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

A participação dos trabalhadores nas decisões ...

Movimento sindical é de luta e divide opiniões


A Lei Nº 11.648/08 dispõe sobre o reconhecimento formal das centrais sindicais no Brasil, e foi sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia 31 de março. Desde então, críticos históricos da organização da classe trabalhadora tentam desqualificar as ações e as lutas lideradas, principalmente, pelos sindicalistas.  Justamente por ser combativo e de luta, o movimento sindical brasileiro divide opiniões, até no mundo acadêmico.

No 37º Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), realizado de 23 a 27 de setembro de 2013 em Águas de Lindoia, no interior de São Paulo, o tema: “Para onde foram os sindicatos?”, ganhou destaque no dia 26 com um debate entre os professores Iram Jácome Rodrigues (USP), Ricardo Antunes (Unicamp) e Adalberto Cardoso (IESP-UERJ).

A primeira resposta foi esboçada por Jácome Rodrigues, professor da Faculdade de Economia da USP. Ele apresentou números preliminares de um levantamento que mostra um deslocamento dos sindicatos e trabalhadores sindicalizados dos grandes centros industriais do Sudeste em direção o Nordeste, a maioria deles trabalhadores rurais ou servidores públicos e manteve o número de filiações.

Segundo o sociólogo Adalberto Cardoso, levantamentos apontam que o número de profissionais sindicalizados não caiu, mas que o movimento sindical brasileiro, “vive um aparente paradoxo”. E apresentou números que, contestam a ideia de que as entidades representativas sofrem uma crise de atuação nos tempos atuais.

“Se tomarmos as taxas de filiação sindical, os resultados das negociações coletivas, as taxas de greves ou a presença de sindicalistas nas esferas de representação política (o parlamento ou a administração estatal), o que se vê, em lugar da crise, é um movimento consolidado e atuante”.

Afirmou que se considerada o total da população ocupada adulta, a taxa de sindicalização hoje é de 17,4%, a mesma registrada em 1988, auge do sindicalismo no País. Para exemplificar a atuação ativa, ele citou os protestos de 11 de junho, quando os sindicatos levaram 100 mil pessoas às ruas de todo o país em plena quinta-feira para pedir a redução da jornada de trabalho e do fator previdenciário.

“Os sindicatos não perderam a capacidade de ação coletiva. Em 2012, ocorreram quase 900 greves no país, 75% delas vitoriosas.” Em 2012, citou Cardoso, 94,6% das negociações coletivas tiveram reajuste acima da inflação.

O especialista contestou ainda a ideia de que os sindicatos foram cooptados pelo governo, abandonaram “as energias utópicas” da revolução e se tornaram apenas pragmáticos. Segundo o professor, a crise do Estado do Bem-Estar Social é “multidimensional” e desatou a crise da ética do trabalho assalariado. A lógica do neoliberalismo, afirmou, passou a privilegiar a ética da acumulação, o empreendedorismo individual e a lógica da meritocracia e da competição pequeno-burguesa.

Em meio a este processo, a trincheira do movimento sindical é contra a diminuição dos direitos trabalhistas adquiridos, no Brasil, durante a era Vargas. “A utopia brasileira é a utopia do trabalho assalariado regulado.” Essa utopia, disse, se materializou com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. O aumento no número de assalariados com carteira assinada coincidiu com a inclusão de sindicalistas ao primeiro escalão do governo, como Luiz Marinho, Luiz Gushiken, Ricardo Berzoini e Jaques Wagner.

“Acho estranho, portanto, que se trate como cooptação ou crise do sindicalismo uma história de sucesso de um projeto político. Pode-se gostar dele, pode-se criticá-lo, mas essa crítica não leva em conta que a utopia brasileira, a utopia real, vivida por gerações sucessivas, foi e segue sendo a utopia do trabalho assalariado regulado pelo Estado, a melhor das alternativas disponíveis.”

Em resposta, o sociólogo Ricardo Antunes, da Unicamp, afirmou: “Há uma crise sindical? Há. É terminal? Não. Mas é profunda”. Segundo Antunes, com a mudança do capitalismo a partir dos anos 70, mudou também a forma de atuação do sindicato. No período, houve uma reestruturação do processo produtivo no cenário global. A financeirização da economia se tornou o elemento de fundação decisivo da exploração dos trabalhadores.

 Como exemplo, citou que hoje, no Japão, 30% dos trabalhadores estão na informalidade. “No México, a mensagem do governo às empresas estrangeiras, em outras palavras, é: ‘Venham aqui porque aqui podemos explorar mais’.”

A lógica hoje, afirmou, é a expansão de empresas enxutas, com menos custos e mais chances de sobrevivência em um mercado trasnacionalizado. “A participação dos trabalhadores nas decisões das empresas só é bem-vinda quando o assunto é irrelevante.”

O modelo de trabalho nessa lógica criou o que ele chama de “precariado”. Enquanto isso, os sindicatos perdem força à medida que optam por negociar ou firmar parcerias, em uma linha de menor resistência, com o Estado. “Na Europa, o trabalho sujo que ninguém queria fazer agora é disputado a tapa. Há uma classe xenófoba em parte dos sindicatos na Europa para manter estes postos.”

Antunes contestou a ideia de que, sob o governo Lula, o movimento chegou ao poder ao lembrar que no período foram cooptadas entidades dispostas a ceder apoio a quem estivesse no governo independentemente do projeto. Caso, segundo ele, da Força Sindical.

“As manifestações evidenciaram a crise dos sindicatos na medida em que há uma nova morfologia do trabalho, um novo proletariado de serviços urbanos, dos trabalhadores do comércio, dos hipermercados, do callcenters. Nessa área de serviços urbanos que se mercadorizaram, que são mais ou menos novos, não se encontra representação forte nos sindicatos. Se você quer lutar contra a degradação da vida urbana, a mercadorização e a privatização do transporte, da saúde, os sindicatos estão muito fechados a essas questões.”

Segundo Antunes, o caminho natural para este esta revolta são as ruas. “As lutas sociais desde 2007, 2008, são a ocupação das praças públicas, numa maneira de dizer que o sistema político tradicional não nos representa. Isso tem sido assim na Europa, nos Estados Unidos, no Oriente Médio. Para além de todas as diferenças desses movimentos, ocupar o espaço público é um traço forte.”

Sobre a Anpocs

Fundada em 1977, a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), entidade de direito privado sem fins lucrativos, reúne mais de uma centena de centros de pós-graduação e de pesquisa em antropologia, ciência política, relações internacionais, sociologia, de todo o Brasil.

A Anpocs representa uma expressiva parcela da inteligência e da intelectualidade brasileiras. Tem a capacidade de lançar mão de um amplo conhecimento acumulado sobre as mais variadas questões locais, regionais, nacionais e internacionais a partir de pesquisas e reflexões baseadas em diferentes pontos de vista disciplinares.


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