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Este parágrafo acima, com palavras
destacadas em maiúscula e redação um tanto confusa, poderia ser parte de um
desses filmes patrioteiros, ou novelas onde os Estados Unidos são mostrados
como um país a ponto de sucumbir diante de um grande mal, com seu presidente
sendo a última fronteira antes do desastre, apelando aos cidadãos para que
enfrentem a usurpação de suas liberdades e reajam valorosamente.
Mas na verdade é só um tuíte do
presidente estadunidense Donald Trump, publicado no dia 2 de outubro de 2019,
no qual ele define o que acha do processo de impeachment, ou juízo político, ao
qual poderia ser submetido, após a descoberta de suas ligações ao presidente
ucraniano Volodymyr Zelenski, para que investigasse o adversário Joe Biden, ex
vice-presidente democrata (durante o governo de Barack Obama) e atualmente
pré-candidato presidencial, por uma suposta ligação com casos de corrupção.
Além do fato em si, nos interessa analisar aqui a estética dessa mensagem.
Trump é o maior exemplo de uma forma
de comunicar que está infectando a política de meio mundo, e que tem nas redes
sociais o seu principal aríete. Contudo, o maior objetivo desse tipo de
mecanismo busca ir além da forma em si e da razão pela qual um político fixaria
normalmente suas posturas. O que este tipo de comunicação pretende é criar uma
audiência fiel, que seja capturada por um clima extremo e permanente de
suspeitas, conspiração e conflito.
Houve um tempo em que o político
conservador clássico era o que prometia grandes medidas que modificariam para
melhor a vida de todos os cidadãos. Talvez, em determinadas ocasiões, dava mais
ênfase a aspectos de especial interesse para seus eleitores: a religião, a propriedade
ou às tradições. Ao adversário somente ataques, geralmente aludindo a que seu
programa político seria pior para o país. Aceitava que existia no país um jogo
político liberal, mas com algumas regras equivocadas que poucos se atrevem a
romper, e que ele era um desses.
Ademais, os meios de comunicação eram
peças essenciais na transmissão dessas mensagens. Em geral, os políticos
conservadores têm uma ampla variedade de alto-falantes, publicações aliadas,
que ajuda a difundir suas ideias. Ainda assim, havia que passar pelo pedágio
das boas relações, dar informação em off e entrevistas exclusivas nas que o
jornalista precisa ao menos parecer minimamente incisivo para conservar sua
credibilidade.
Este cenário está mudando
radicalmente. Trump não trata seus simpatizantes como eleitores, condição
variável que se refere a um apoio em um momento preciso. Seu discurso aponta a
um público que como a audiência de um programa televisivo, habitualmente de ficção,
que precisa da constante espetacularização para não desconectar ou mudar de
canal.
Trump não é um político de promessas
concretas, fiscalizáveis em sua execução. Sempre alude a grandes temas
(imigração, segurança, liberdades) situando-os num contexto de extrema urgência
que só ele pode resolver, quase sempre com alguma medida abstrata e
incomensurável. Seu adversário político não é só o Partido Democrata, e sim uma
gama indefinida na qual entram desde os meios de comunicação até os senadores
do seu partido que não seguem a sua lógica.
Os meios de comunicação são os
inimigos preferidos. Ele precisa desprestigiá-los, já que não são mais úteis na
equação. Seu ambiente são as redes sociais, onde não tem que suportar
impertinências de nenhum jornalista, e onde pode conduzir seu show com total
liberdade e eficácia.
Acontece, também, outra coisa bem
interessante: seu público se sente diretamente aludido, estabelecendo uma
conexão emocional onde se cria a fantasia de proximidade. Exemplo disso é o que
ocorreu no começo de setembro, com outro representante dessa nova direita: o
presidente de Brasil, Jair Bolsonaro, que foi submetido a uma operação. Em suas
redes sociais, foi difundida uma imagem na que ele aparecia na sala de cirurgia
rodeado pela família e por colaboradores, todos vendo a popular série
televisiva mexicana “Chaves”. Na versão em vídeo do mesmo encontro, ele aparece
agradecendo a Deus e aos que rezaram por ele. A resposta não tardou: milhares
de pessoas se sentiram partícipes, quase protagonistas de sua recuperação.
Aqui vai outro aspecto importante
dessa estratégica comunicacional: Trump e Bolsonaro, ao serem presidentes
poderiam se dirigir aos estadunidenses ou aos brasileiros em geral, mas o que
realmente fazem é aplicar essa condição de cidadania simbólica tão somente ao
seu público. Existem os seus seguidores, que representam a gente de bem, e
depois o resto, os que seus aliados se encarregam de adjetivar a partir de suas
ideologias.
Assim, Trump e Bolsonaro, criam uma
brecha social enorme, sem ignorar esse conflito, mas apresentando-o sempre como
um ataque do que são vítimas, e que é conduzido por um inimigo difuso, que se
atreve a contradizer suas políticas, percebidas por seus fiéis como algo
natural, único, sensato e razoável, enquanto as dos opositores se guiam pela
mesquinharia ideológica, que pretende acabar com o país e seu povo bom e
trabalhador.
Viktor Orbán na Hungria, Marine Le Pen
na França e Matteo Salvini na Itália seguem estratégias muito parecidas de
utilização das redes, e até mesmo políticos de suposta linha liberal, como o
britânico Boris Johnson e o espanhol Albert Rivera, já foram voluntariamente
contagiados por este modus operandi. O salvadorenho Nayib Bukele, como já
comentamos nestas mesmas páginas, se tornou um dos alunos mais destacados dessa
escola, levando o trumpismo comunicacional a níveis que inclusive superam o do
exemplo original.
Entretanto, seria injusto parar por
aqui e culpar somente Trump e companhia por este comportamento. Embora esta
nova linha de políticos direitistas tenha agido para pulverizar muitas das
regras da institucionalidade liberal, também é preciso dizer que o ecossistema
político já se encontrava sob questionamento antes do surgimento deles.
Uma política a serviço das elites
econômicas, centrada na globalidade das finanças, mas que acabou descuidado os
cidadãos comuns, foi o principal fator que gerou esse clima – além, claro, dos
meios de comunicação que cultivaram relações estreitas demais com o poder. Essa
falta de alternativas reduziu a capacidade da esquerda de se opor ao que parte
da sociedade entendeu ser um mal menor.
O paradoxal não é o fato de que esses
novos políticos direitistas favorecem tanto ou mais essas mesmas elites
econômicas que dizem combater, contrariando sua própria retórica, mas sim sua
capacidade de fazer isso e de direcionar a ira popular em quem tem menos culpa,
colocando os setores médios contra os mais fracos, sendo eles os líderes deste
impressionantemente lamentável espetáculo da política no Século XXI.
Fonte: Publicado originalmente em rt.com |
Tradução de Victor Farinelli
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