Na França, onde o voto não é
obrigatório, apenas quatro em cada dez eleitores compareceram às urnas para
votar nas eleições municipais de junho, levando ao recorde de 60% de abstenção
(12 pontos percentuais a mais do que o observado no pleito municipal anterior,
em 2014).
Como o voto é obrigatório no
Brasil, cientistas políticos não preveem um patamar tão alto de abstenção por
aqui. Acreditam, porém, que deve haver aumento na comparação com a disputa
eleitoral de 2016, quando mais de 25 milhões de eleitores não compareceram às
urnas no primeiro turno (17,6% do total de brasileiros aptos a votar) — o que
pode impactar resultados nas disputas mais apertadas.
Naquele ano, houve a
terceira alta seguida de abstenção nas eleições municipais, fenômeno que indica
um aumento do "desalento" dos eleitores, ou seja, uma menor confiança
na política e no valor do seu voto, afirmam estudiosos. Para o cientista
político Ivan Filipe Fernandes, professor da Universidade Federal do ABC
(UFABC), essa tendência deve ser agravada pela pandemia.
"Neste ano, teremos
pessoas com medo de contrair covid-19 e fazendo aquele cálculo de se vale a
pena sair de casa considerando o efeito pequeno do seu voto individual no
resultado da eleição. Somando isso com um processo em que as pessoas já estão
desalentadas com a política, a minha expectativa é que aumente muito o não
comparecimento. Acredito que teremos abstenção recorde neste ano", afirma
o professor, autor de estudos sobre abstenção eleitoral.
Para Fernandes, o aumento da
abstenção pode impactar o desfecho de eleições que estiverem mais acirradas,
como o caso de São Paulo. "Já em Belo Horizonte, onde as pesquisas apontam
que o atual prefeito (Alexandre Kalil, do PSD) tem grande vantagem e deve ser
eleito em primeiro turno, uma abstenção maior não deve afetar o
resultado", ressalta.
O cientista político Antonio
Lavareda, presidente do conselho científico do Instituto de Pesquisas Sociais
Políticas e Econômicas (Ipespe), acredita que a pandemia afetará a disposição
do eleitor em votar por duas formas: tanto devido ao temor de ser infectado ao
sair de casa, quanto pelo esfriamento da campanha eleitoral, já que neste ano a
realização de eventos na rua e de debates pelas redes de televisão foi reduzida
como forma de evitar o contágio da doença.
Ele nota que as eleições
regionais realizadas no Uruguai em setembro tiveram alta taxa de participação
(85% dos eleitores compareceram). Na sua avaliação, porém, o cenário deve ser
diferente no Brasil porque aqui a proporção de pessoas infectadas e mortas pela
doença é bem maior, o que tende a gerar mais cautela entre os eleitores.
Enquanto o Brasil registra uma taxa de 710 óbitos devido ao coronavírus por
milhão de habitantes, no Uruguai esse índice é de 12 mortes.
Segundo Lavareda, o impacto
de um aumento na abstenção sobre o resultado das eleições dependerá de como
esse fenômeno afetará diferentes segmentos da sociedade.
"Se a pandemia afastar
das urnas especialmente idosos (grupo de risco da covid-19) e os mais pobres,
que historicamente têm taxas maiores de abstenção, naturalmente candidatos que
tenham apoio maior desse segmentos perderão mais votos com a abstenção",
exemplifica.
É um fenômeno que poderia
afetar, por exemplo, o candidato a prefeito de São Paulo Celso Russomano
(Republicanos). Segundo pesquisa Ibope do início de outubro, o candidato lidera
as pesquisas com 26% de intenção de voto, mas tem seu melhor desempenho entre
os que ganham até um salário mínimo. Nesse grupo, 34% responderam que votarão
em Russomano. Nesse segmento, porém, apenas 69% dos entrevistados disseram que
com certeza comparecerão às urnas, enquanto 31% responderam que, devido ao
coronavírus estão na dúvida (22%) ou não irão "de jeito nenhum" (9%).
Já na média geral dos
entrevistados em São Paulo, 75% garantiram que votarão no dia 15 de novembro. "Este
ano, vamos ver aqui algo parecido com a eleição dos Estados Unidos (onde o voto
não é obrigatório). Não basta o candidato pedir voto, tem que convencer o
eleitor a sair pra votar", nota Lavareda.
Em outras cidades
pesquisadas pelo Ibope, a disposição em votar mesmo na pandemia é ainda menor,
caso de Salvador, onde 69% pretendem ir às urnas com certeza, e Rio de Janeiro
(71%). Por outro lado, esse percentual sobe em capitais como Belém (83%) e
Vitória (84%).
Fonte:
https://www.bbc.com/portuguese/brasil
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