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segunda-feira, 18 de abril de 2022

Inflação e aumento real de salários: uma comparação

Você deve ter percebido, principalmente na hora de fazer as compras no supermercado, que tudo está mais caro. Neste mês de março, o Brasil registrou a maior inflação para o período dos últimos 28 anos – os preços subiram 1,62% depois de já terem avançado 1,01% em fevereiro. Está cada vez mais difícil fechar as contas: enquanto os preços não param de subir, o aumento real de salário atinge cada vez menos categorias.

Durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PT, a situação era muito diferente: o salário mínimo teve aumento real (acima da inflação) de 76% entre 2002 e 2016, e 93,8% das categorias trabalhistas tiveram aumento maior do que a inflação no ano de 2010. Com Bolsonaro, não apenas não houve nenhum aumento real do salário mínimo, como também 47% de todas as categorias trabalhistas tiveram perda salarial em 2021.

Em 2010, no último ano do governo Lula, a porcentagem de categorias com ganho salarial igual ou maior que a inflação era de 96,2% – apenas 3,8% das categorias tiveram perdas salariais naquele ano. Esses bons índices se mantiveram ao longo dos dois mandatos de Lula, graças à política de valorização do salário mínimo, que impactou boa parte da massa salarial do País.

Em um cenário de expansão econômica (em que pese a crise mundial de 2008) e inflação em baixa, a participação dos salários no PIB aumentou de 46,26%, em 2003, para 51,4% em 2009. Entre 2002 e 2015, o aumento real do salário mínimo foi de 76,54%. A política de valorização do salário mínimo, um dos pilares da inclusão social do período (que se tornaria modelo para o mundo), foi uma das principais responsáveis por manter a economia aquecida durante a crise econômica internacional de 2008.

Lula transformou a valorização do salário mínimo em lei, fruto de construção conjunta com os movimentos sindicais. A lei garantia o reajuste real do salário mínimo por meio de sua correção a partir do repasse da inflação do ano anterior somado à variação do PIB de dois anos antes. A política de valorização do salário mínimo foi renovada pela ex-presidenta Dilma Rousseff, que editou lei garantindo sua duração até 2019. O aumento real baseado em regras que davam previsibilidade aos agentes econômicos contribuía para estimular os investimentos na produtividade e portanto sustentar o crescimento de toda a cadeia salarial.

Com a eleição de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, imediatamente o salário mínimo tornou-se um problema para o governo. A política de valorização foi revogada e entre 2019 e 2022, o aumento real do salário mínimo foi de 0% (zero por cento). Estima-se que cerca de 48 milhões de pessoas tenham a remuneração baseada no salário mínimo no Brasil. São 3 anos de mínimo corroído pela altíssima inflação.

A economia em frangalhos de Bolsonaro e Paulo Guedes também tem impactos desastrosos no mercado de trabalho. Dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos socioeconômicos) apontam que os trabalhadores da iniciativa privada têm encontrado dificuldade em reajustar seus salários acima da inflação.

Nos últimos três anos, desde que Bolsonaro assumiu a Presidência, houve uma piora acentuada nessa questão. Em 2018, apenas 9% das categorias não havia conseguido aumento além da inflação. Em 2021, esse índice cresceu mais de cinco vezes, para 47%.

As causas que explicam esse fenômeno são a retomada lenta da economia depois da pandemia da covid-19 e a inflação acelerada, dois fatores que deveriam estar sob controle do governo Bolsonaro, que tem feito uma gestão desastrosa de todas as áreas, mas principalmente da área econômica. O povo paga a conta no mesmo passo em que o Brasil.

Inflação recorde em 28 anos

As pessoas dizem que é culpa da inflação, mas o que será isso? A inflação é o aumento geral de preços de bens e serviços. Ela implica na diminuição do poder de compra dos brasileiros, e pode ser medida por um índice chamado IPCA  (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo),que aponta, segundo o IBGE, a variação do custo de vida médio de famílias com renda mensal de 1 e 40 salários mínimos.

A inflação de março ficou em 1,62% – a última vez em que a taxa foi maior do que isso num mês de março foi em 1994, antes do Plano Real, que veio justamente para conter a hiperinflação que já era regra no período. Em 2021, a inflação já chegou a 11,30% no acumulado dos últimos 12 meses, o maior valor 19 anos, segundo dados do IBGE.

Os grandes vilões dessa alta foram os transportes e isso se deve graças ao aumento 6,70% no preço dos combustíveis. A gasolina, com alta de 6,95%, teve o maior impacto individual no IPCA de março, mas os preços do gás veicular, do etanol e do óleo diesel também subiram significativamente. O diesel, inclusive, é o subitem não alimentício que mais subiu nos últimos 12 meses, 46,47%.

Além disso, todos os itens alimentícios tiveram alta e produtos que fazem parte da mesa do povo brasileiro ficaram muito mais caros. A inflação dos alimentos que fazem parte da cesta básica disparou no mês de março no Brasil e superou a marca de 21% no acumulado de 12 meses, segundo estudo da PUC/PR . O motivo? Além da desastrosa condução da economia pelo atual governo, Bolsonaro destruiu os estoques reguladores da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o que dificulta o controle dos preços dos alimentos.

Por: https://lula.com.br/inflacao

Artigo: A função social da economia.

“A desigualdade é antes de tudo uma construção social, histórica e política” (Thomas Piketty).

“Podemos certamente dizer que a nossa proficiência tecnológica excede de longe o nosso desenvolvimento moral, social e político” (Oliver Stone e Peter Kuznick).

Pequena história da exploração

A revolução digital está tendo impactos tão profundos quanto em outra era teve a revolução industrial. O que chamamos de capitalismo tem as suas raízes na industrialização, que envolveu transformações tecnológicas, mas também de relações sociais de produção, com o trabalho assalariado e o lucro do capitalista, além de um marco jurídico centrado na propriedade privada dos meios de produção. Com a revolução digital, que envolve uma expansão radical das tecnologias, bem como a generalização da economia imaterial, a conectividade global, o dinheiro virtual e o trabalho precário, a própria base da sociedade capitalista se desloca.

Em particular, a apropriação do produto social por minorias ricas, mas improdutivas, já não exige geração de emprego e produção de bens e serviços. Passa pela intermediação do dinheiro, do conhecimento, das comunicações e das informações privadas. Onde dominava a fábrica hoje temos o domínio das plataformas em escala planetária, que exploram não só as pessoas, por exemplo, através do endividamento, mas também as próprias empresas produtivas através dos dividendos pagos a acionistas ausentes.

O presente estudo está centrado precisamente no que está mudando no que chamamos de modo de produção capitalista. A atividade industrial permanece, sem dúvida, como permaneceu a atividade agrícola diante da revolução industrial, mas o eixo de dominação e controle já não está nas mãos dos capitães da indústria, está na mão dos gigantes financeiros como BlackRock, de plataformas de comunicação como Alphabet, de ferramentas de manipulação como Facebook, de intermediários comerciais como Amazon.

O mecanismo de apropriação do excedente social mudou, e com isso mudou a própria natureza do sistema. Estamos no meio de uma transformação profunda da sociedade, nas suas dimensões econômicas, sociais, políticas e culturais, gerando o que tem sido chamado de crise civilizatória. Estamos transitando para outro modo de produção, e o presente estudo sistematiza os novos mecanismos.

A eterna exploração

Em diversas eras e sociedades, a apropriação do produto social por minorias sempre esteve no centro da organização da sociedade como um todo. O ponto de partida é a própria existência do excedente social. Quando a produtividade de uma sociedade se eleva, permitindo que se produza mais do que o básico necessário para as famílias, aparecem elites que reivindicam, por alguma razão, e com justificativas mais ou menos duvidosas, o direito a ter mais do que os outros, apropriando-se do produto de terceiros. No modo de produção escravagista, apropriavam-se do que produzem os escravos, uma apropriação baseada na força, e explicada como legítima propriedade de pessoas.

Quando Lincoln consegue que se aprove, no século XIX, o fim da escravidão, não se indenizou os escravos, e sim os donos de escravos, por perderem “propriedade”. Sempre houve explicações, que hoje chamamos de narrativas, para justificar o absurdo: eram pretos, ou selvagens, ou não teriam alma, como se dizia na época, ou ainda foram capturados em “guerra justa”, como também se dizia. O essencial era que produzissem um excedente, que permitia o luxo dos proprietários e o financiamento da repressão aos numerosos levantes. Era o modo de produção escravagista, injusto, mas estável, durou muitos séculos, inclusive com leis que regiam o sistema da propriedade de seres humanos e religiões que as sacramentavam. A razão do mais forte sempre busca parecer justa.

No sistema feudal, elites se apropriaram da terra, base de qualquer economia antes que surgissem as máquinas. Os senhores feudais, por razões diversas, mas essencialmente por disporem de armas e fortificações, em luta uns com os outros terminavam por delimitar os feudos, sendo que a população rural que vivia nas terras não seria propriedade do aristocrata, mas seria sim regida por sistemas complexos de obrigações que proibiam que deixassem o feudo. Os homens eram servos, serviam. O excedente produzido era apropriado, na idade média e em grande parte da renascença – na Rússia até 1917 – pelos “senhores”. Os trabalhadores da terra eram obrigados a ceder aos aristocratas grande parte da sua produção, riqueza que permitia que o nobre tivesse um castelo, vivesse com luxo, e pudesse pagar a tropa que assegurava que o sistema se mantivesse. Aqui também houve inúmeras revoltas e repressões.

Parte do excedente servia também para sustentar os conventos, numa religião que, a partir do século IV, se aliara aos poderosos, e justificava o sistema como vontade divina. As leis asseguravam a coerência do sistema, as regras do jogo por assim dizer, inclusive, por exemplo, na Europa, o jus primae noctis, que dava ao aristocrata o direito de se apropriar da primeira noite de casamento de uma camponesa. Os poderosos gostam da legalidade, conquanto sejam eles a fazer as leis. E para os que a contestavam havia também a inquisição e outros sistemas repressivos.

De toda forma, era um modo de produção, também durou séculos, definido por uma base econômica, a terra, relações sociais de produção, a servidão, e formas de extração do excedente sob forma de imposições de diversos tipos. O conjunto era regido por regras, em boa parte respeitadas. A apropriação do excedente era baseada nas leis, justificadas pelo sangue azul dos nobres, sancionada pela igreja com narrativas, e garantida pela repressão militar. Os bailes de Versalhes ou de Viena tinham de ser financiados por alguém. Witold Kula, um historiador polonês, escreveu para o sistema feudal o que Marx escreveu para o sistema capitalista. Era um sistema, um modo de produção.

Ainda que os dois sistemas que mencionamos acima, o escravagista e o feudal, nos pareçam hoje historicamente distantes, precisamos lembrar que a escravidão no Brasil existiu até o fim do século XIX, nos Estados Unidos até a Guerra de Secessão, que a exploração das populações colonizadas era geral e durou até meados do século passado, e que o sistema de apartheid durou até ontem na África do Sul e perdura ainda na Palestina. Nem os Estados Unidos nem o Brasil lograram ainda absorver e ultrapassar a opressão e as desigualdades herdadas do passado escravagista, a África enfrenta penosamente a reconstrução necessária. O passado não é assim tão distante. É um rabo longo que demora a passar. Em muitas nações erigidas em países, ainda é estruturalmente decisivo.

O modo de produção capitalista nos aparece com outro nível de legitimidade. Na base da transformação esteve o avanço científico, a revolução energética, o aumento da produtividade e, portanto, a possibilidade de gerar um ciclo sustentado de enriquecimento social. O Liberté, Egalité, Fraternité da revolução francesa ecoou pelo mundo. Com o Iluminismo, a busca dos valores na sociedade passara a abrir frestas no obscurantismo, reduzira-se o número de mulheres queimadas como bruxas (“não permitirás que as bruxas vivam” instrui a Bíblia, Exodus 22:18), geraram-se a visão de enriquecimento como fruto legítimo do esforço, e o conceito do mérito como virtude. A narrativa evoluiu. O trabalhador passou a ter a liberdade de pedir emprego e de ser explorado. A revolução industrial trouxe outro nível de produtividade, aumentou a prosperidade, mas não para todos. Um avanço, sem dúvida, e o mecanismo de exploração evolui, mas se mantém, as narrativas mudam, e a repressão se moderniza. Em particular, a exploração e violência mais direta se deslocam para o Sul.

No estudo “A Formação do Terceiro Mundo”, apresentamos a dimensão global que o capitalismo adquire, em que a industrialização da Inglaterra, sistema bem capitalista, se apoiou na reprodução da escravidão nos Estados Unidos e outros países que lhe forneciam matéria prima. O capitalismo do império britânico não teve reticências em usar de escravidão, trabalho forçado e massacres em diversas partes do mundo, e hoje assistimos impressionados à Inglaterra se desculpando pelo que fez na Índia, no Quênia e tantos outros países, à França pedindo desculpas a países africanos pelas violências do passado, os Estados Unidos pelo que fizeram no Irã. Daqui a alguns anos irão se desculpar pelo que fizeram no Afeganistão. Lembremos que a Bélgica, no Congo, foi responsável por milhões de mortes, processo documentado no estudo “O Fantasma do Rei Leopoldo”. A prosperidade dos países hoje ricos não se deve apenas à produtividade e racionalidade do sistema capitalista. A fraternité tem claros limites. Muitos até hoje não se dão conta dos subsistemas primitivos em que se apoiou o chamado liberalismo capitalista. O Brasil contribuiu muito.

Em termos gerais, o sistema capitalista dos países ricos se baseou em articulações com sistemas pré-capitalistas nos países colonizados ou simplesmente dependentes. Samir Amin, em livro clássico, chamou corretamente este sistema de ‘acumulação do capital em escala mundial’. Essa dimensão da acumulação permitiu uma apropriação do excedente, por meio da exploração dos trabalhadores e apropriação da mais valia nos países centrais, mas também por meio da exploração colonial direta ou a troca desigual, com a narrativa de trazer a civilização aos povos primitivos, e evidentemente com a força militar.

A religião, aqui também, frequentemente serviu de bálsamo civilizatório. Isso foi ontem, meus anos de universidade eram contemporâneos com as lutas de libertação nas colônias. Hoje temos países independentes, que podem decidir livremente por quem serão explorados, se por sistemas de endividamento ou de troca desigual, ou ambos. A exploração muda de forma, às narrativas atualizam o discurso, o controle militar se torna mais sofisticado. Mas estamos sempre servindo elites.

O equilíbrio precário: produzir para quem?

Essa pequena retrospectiva nos ajuda a lembrar a que ponto a barbárie que hoje nos chocaria – a escravidão, a servidão, o colonialismo, o apartheid – ainda é próxima, e a que ponto sobrevive e penetra no nosso cotidiano. Basta olhar a cor das pessoas nas nossas favelas ou nos bairros das periferias urbanas e nas prisões nos Estados Unidos. Também devemos atentar para o impacto que têm as diversas formas de organização dos países em desenvolvimento, não só porque seguem em grande parte especializados em produtos primários, o que trava a modernização, mas porque quem exporta precisa da mão de obra apenas para o trabalho, não para o consumo: o produto vai para o mercado externo, e o consumo das elites é em boa parte garantido por produtos importados. Para quem produz para o mercado externo, e importa os produtos acabados, não é indispensável o poder de consumo dos seus trabalhadores. Em pleno século XXI no Brasil, a reprimarização gera o mesmo desprezo pela elevação capacidade de consumo da população.

A miséria impressionante dos trabalhadores, coisa que vemos até hoje no que chamamos de países em desenvolvimento, mesmo com tecnologias as mais avançadas, resulta dessa forma de acumulação de capital, em que dinamizar a capacidade de compra da base da sociedade não é essencial, pois o ciclo de acumulação se fecha em boa parte no exterior. Ao mesmo tempo, o avanço tecnológico torna a necessidade de contratar mão de obra menos essencial, pelo processo de substituição. Assim que há modernização tecnológica, mas com pouca transformação das relações sociais, perpetuando a desigualdade e a pobreza. É a herança social da relação Norte-Sul.

O leitor interessado nesse mecanismo poderá consultar o meu “Formação do Capitalismo no Brasil”. A ideia essencial, que tive oportunidade de discutir tanto com Samir Amin como com Caio Prado Júnior, é que o ciclo de reprodução do capital dos países pobres se fecha no exterior, a necessidade de mão de obra se reduz, e a troca desigual e o endividamento asseguram o resto. A modernidade tecnológica convive sem problemas com exploração em grande medida pré-histórica.

Nos próprios países industrializados, no chamado Ocidente que representa cerca de 15% da população mundial, a tensão entre aumentar a exploração e assegurar a capacidade de compra da população se colocou com força. Foi preciso o mundo capitalista dominante enfrentar a crise de 1929 para que se tomasse consciência de que não basta produzir, é preciso assegurar o consumo, para fechar o ciclo de acumulação de capital. As exportações para os países mais pobres, em troca de matérias primas, não seriam suficientes, e o New Deal de Roosevelt tem na sua essência a geração, por meio do Estado, de maior capacidade de compra por parte da população em geral. Sherwood, que escrevia os discursos do Roosevelt, detalhou o programa em brilhante livro, Roosevelt and Hopkins. Hopkins era o importante na execução do New Deal.

A Guerra de Secessão, nos anos 1860, além da libertação dos escravos, tinha rompido o ciclo colonial do algodão trocado por importações britânicas, interiorizando o ciclo de reprodução de capital, nas novas relações entre o nordeste industrial e o sul produtor de matéria prima. Mas foi o New Deal que gerou uma incorporação ampla da população americana na prosperidade. O consumo na base da sociedade, financiado inicialmente pelo Estado, gerou demanda, logo redução dos estoques acumulados nas empresas, e em seguida a retomada da produção, logo aumento do emprego, gerando ainda mais demanda, permitindo um ciclo de acumulação do capital desta vez de forma equilibrada. Eric Hobsbawm, no livro “A era dos extremos”, detalha essa transformação econômica e cultural.

Entre os aportes de Keynes que demonstrou a necessidade de se assegurar a demanda agregada, o impacto do sucesso do New Deal, e o bom senso de um Henry Ford afirmando que bons salários eram necessários para que os seus carros fossem comprados, abriu-se uma nova visão, a do Welfare State, Estado de Bem-Estar. Não se podia mais dizer que os trabalhadores não teriam a ganhar com o capitalismo. Por uma vez, e em particular durante os 30 anos “gloriosos” do pós-guerra, tivemos uma dinâmica impressionante nos países ricos, com o equilíbrio da capacidade de produção e da demanda social, da dinâmica empresarial e do investimento público. Em termos políticos, gerou-se a socialdemocracia.

Lembremos, uma vez mais, que para uma economia exportadora de bens primários que importa bens industrializados, o mercado está no exterior, e as tecnologias substituem empregos, assim que expandir os empregos e aumentar os salários dos trabalhadores não seriam prioridades. Angola exporta petróleo e importa bens de consumo para as elites. Na América Latina, quando se tenta democratizar a economia, voltam ditaduras.

Podemos ter democracia, conquanto não a usemos: o resultado é democracia política formal, o voto, sem a democracia econômica. A pandemia apenas veio escancarar a fratura econômica, política e social. No Brasil, hoje um dos maiores exportadores de produtos agrícolas do mundo, temos 19 de milhões de pessoas que passam fome, e 116 milhões em situação de insegurança alimentar, em pleno 2022. Com um andar acima em termos de tecnologia e de volumes de extração, chegamos a um novo tipo de tecnocolonialismo. Com algumas exceções como evidentemente a China, e também alguns tigres asiáticos, a fratura planetária do capitalismo se tecnifica, mas se aprofunda.

Por: Ladislau Dowbor, professor e economista.